segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Contradições

Uma amiga me disse que eu sou uma pessoa contraditória. “Contraditória?” perguntei. Ela respondeu que era no bom sentido, porque eu tenho posturas extremamente firmes que revelam quem eu sou e em que eu creio e, por outro lado, eu tenho hábitos e práticas que não são freqüentes em quem tem tantas convicções. Concluindo, ela me disse que era bom conversar comigo porque ela se sentia mais leve ou menos culpada por coisas que ela fazia.
Ouvir isso me deixou muito feliz, porque me senti bastante verdadeira, autêntica, sem máscaras. Quem sabe isso já seja um pequeno vislumbre de qualquer coisa parecida com o cristianismo autêntico. Quem sabe eu já tenha alguma semelhança com Jesus?
A Bíblia não pôs máscaras em ninguém ao retratá-los. É de conhecimento público que Davi, homem segundo o coração de Deus, era adúltero; que Noé era beberrão; que Moisés era homicida; que Salomão construiu o templo e foi o primeiro a profaná-lo. Se todos ficaram sabendo dos erros deles, por que os meus ficam escondidos, se é Cristo quem me justifica?
Jesus era tido como contraditório também. Ele pregava um padrão de vida excelente, mas andava cercado por prostitutas, ladrões, cobradores de impostos e toda a corja indesejável de Israel. Ele pregava o amor, mas provocou um belo prejuízo aos comerciantes das imediações do templo.
Paulo diz que Deus usou as coisas loucas do mundo para confundir as sábias. Isso também é contraditório. Jesus disse que quem quisesse ganhar a própria vida, a perderia, e quem a desse, ganhá-la-ia.
O cristianismo é cheio de contradições. O evangelho é loucura.
“Se afirmarmos que estamos sem pecado, enganamos a nós mesmos,
e a verdade não está em nós.”
(1João1.7)

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Justiça, misericórdia e graça

Tinha sido avisado inúmeras vezes. Sabia que dessa vez não haveria perdão. Enquanto esperava na porta da direção da escola, lembrava o quão banal havia sido a provocação que o levara até ali. João, seu idiota, repetia para si mesmo, por que você aceitou brigar? Imaginava a punição que seus pais lhe dariam. Provavelmente, levaria uma surra sem igual e ficaria de castigo por meses. Já havia se conformado a não ver TV pelos próximos dias, nem jogar videogame, mas ainda esperava continuar treinando futebol, apesar das ameaças. Se eu tiver que conversar mais uma vez com sua diretora, nem o futebol será poupado!


Dona Márcia! Ouvira alguém chamando no fundo do corredor. Sua mãe havia chegado e já entrara na sala da diretora. Ele nem olhou para ela, temendo ser fulminado por seu olhar, mas sabia que só estava adiando esse momento, que, cedo ou tarde, chegaria. Os minutos que sua mãe passara na sala da diretora pareciam-lhe uma eternidade, uma angustiante eternidade...


Vamos. Foi a única palavra que ela dissera ao sair da sala da diretora. Seu olhar estava muito mais decepcionado do que fulminante. O que eu fiz? Pensava arrependido. Ver sua mãe decepcionada era pior do que qualquer punição. Ele merecia não poder jogar futebol pelo resto da vida. Sua mãe estaria certa se o proibisse.

Entraram no carro. Sua mãe continuava sem dizer palavra. Ele tentava imaginar o que ela pensava. Chegaram, e sua mãe permanecia muda. Ele se dirigiu ao próprio quarto; certamente, pioraria a situação se ficasse pela sala ou se ligasse a televisão. Enquanto subia as escadas, sua mãe quebrou o silêncio. Falaremos juntos com você, eu e seu pai. Ele fez que sim com a cabeça e prosseguiu seu caminho.

No quarto, ele se sentia como um réu que está para ser condenado. O relógio não andava, já havia verificado várias vezes se não estaria parado. Rolava pela cama. Remexia nos livros. Não conseguia ler nada. Não tinha coragem de ligar o computador, não merecia qualquer tipo de diversão. Imaginava que seus próximos meses seriam muito parecidos com aqueles momentos.

Seu pai chegou. Ouviu passos pela casa. Vozes conhecidas e decepcionadas. Silêncio. Por fim, passos na escada. A hora havia chegado, em alguns segundos conheceria sua pena. A maçaneta. Entraram. Seus pais estavam de mãos dadas. Isso significava que eles estavam em pleno acordo sobre o que ia acontecer. Puxaram duas cadeiras e se sentaram de frente para a cama. Ele sentou, não conseguia fixar o olhar em seus pais, olhava para baixo, envergonhado do que havia feito.


- Filho, você sabe que queremos o seu melhor, não é? - Começou seu pai.

O garoto fez que sim.

- Olhe para nós.

Ele ergueu o rosto, mas desviava o olhar.

- Nós queremos te ensinar algo muito importante.

Somente neste instante viu que o pai estava com um largo cinto nas mãos. Já esperava pela surra, mas se assustou com a largura do cinto.

- Nós queremos te ensinar três conceitos: justiça, misericórdia e graça. Diga, sinceramente, pelo que você fez, o que você merece?

Temendo agravar sua condenação, ficou em silêncio um tempo.

- Não tenha medo de dizer a verdade. Nós já decidimos o que vamos fazer, o que você disser não pode piorar sua situação. O que você merece?

- Castigo. - Sussurrou ele.


- Que tipo de castigo? Se você estivesse no meu lugar agora, que castigo você daria a seu filho? – perguntou o pai com voz mansa.

- Acho que daria uma surra nele e tiraria o que ele mais gosta. – Respondeu apreensivo.

- Então no seu caso, você merece ficar um bom tempo sem futebol, certo?

O filho fez que sim com a cabeça.

- Isso seria ser justo. Justiça é dar aquilo que se merece. Você comete um erro e paga por ele, mesmo que se arrependa, porque, mesmo arrependido, é impossível desfazer o que já foi feito, é impossível voltar no tempo. Por exemplo: uma pessoa que mata outra continua sendo um assassino, por mais que se arrependa, ele não pode devolver a vida ao assassinado. Contudo, a justiça tem um defeito, mesmo que a justiça mate o assassino, ela não devolve a vida ao morto.

João ergueu o rosto surpreendido pela fala do pai. Aonde será que ele quer chegar? Perguntava-se.

- Deus sabia disso. Mesmo que ele punisse o erro, isso não desfaria o erro. Por isso, dissemos que Deus é misericordioso. Me diga, se eu resolver ser bonzinho com você, o que eu faria?

- Não me bateria com esse cinto largo que está na sua mão.

- Sim, é verdade. Só isso? Eu manteria algum tipo de castigo? Ponha-se no meu lugar novamente.


- No seu lugar, se eu fosse um pai bonzinho, acho que haveria um castigo, só que leve. Não sei, talvez, deixasse meu filho sem poder sair de casa por uma semana.

- Você está raciocinando muito bem. Isso é ser misericordioso: dar uma pena leve ou não punir. Eu, você e sua mãe temos pecados, nós não pagamos por eles para sermos perdoados, porque Deus é misericordioso conosco. O que você acha de eu ser misericordioso com você e não te dar nenhum castigo?

- É errado! Eu mereço um castigo. Eu desobedeci. Eu tenho que ser punido. – As últimas palavras do pai não faziam sentido para João.

- Sim, João, o que você merece é um severo castigo, mas, se eu for misericordioso, você não será punido.

João não sabia se devia ficar alegre com a possibilidade de não ser castigado. Seus pais já haviam cumprido ameaças anteriores e sentia dores só em lembrar das ocasiões. O que acontecera a eles?

- Entretanto, João, Deus não se contenta em ser misericordioso. Imagine, novamente, se você estivesse no meu lugar, e, ao invés de cortar o futebol da sua vida, você resolvesse dar a ele um pacote de viagem incluindo ingressos diários para a próxima Copa do Mundo. O que você acha disso?

- Pai, isso é muito injusto! Eu nunca faria isso com um filho meu. Se ele desobedeceu, precisa ser castigado!

- É exatamente isso que Deus faz conosco, Deus vai além da misericórdia e age conosco graciosamente. Isso se chama graça. É dar aquilo que não se merece. Você merece castigo, mas ganha uma viagem. Deus nos dá o céu, mas merecíamos o inferno.

Não se sabe se João foi alvo da justiça, da misericórdia ou da graça dos pais, mas, certamente, ele foi alvo da Graça de Deus.

“Como os outros, éramos por natureza merecedores da ira. Todavia, Deus, que é rico em misericórdia, pelo grande amor com que nos amou, deu-nos vida com Cristo, quando ainda estávamos mortos em transgressões — pela graça vocês são salvos”. (Efésios 2. 3-5)

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Um herói da fé


“Todos estes viveram pela fé, e morreram sem receber o que tinha sido prometido; [...] reconhecendo que eram estrangeiros e peregrinos na terra. [...] Esperavam eles uma pátria melhor, isto é, a pátria celestial. Por essa razão Deus não se envergonha de ser chamado o Deus deles, e lhes preparou uma cidade. [...] O mundo não era digno deles. [...] Deus havia planejado algo melhor para nós, para que conosco fossem eles aperfeiçoados.” (Hebreus 11)
Quando leio o texto de Hebreus 11, sempre me lembro dos heróis do passado, que eu só conheço de ouvir falar. Mas, hoje, esse texto me remete a um exemplo vivo, pelo menos por enquanto: pastor Xavier.
Hoje, à tarde, assisti ao vídeo de um culto de gratidão pela vida do pastor Xavier, no site da Igreja Batista Memorial da Tijuca (http://www.ibmt.org.br/). E fiquei impressionada com o vigor, a vivacidade e a convicção que ele demonstrava.
Há quatro semanas, os médicos declararam que ele teria, no máximo, 4 dias de vida. Na ocasião, o pastor Xavier declarou: “Senhor, estou pronto”. No dia 15 de setembro, ele pregou uma belíssima mensagem. Várias falas dele me impressionaram.
Ele disse que naquele dia deveria ser prestado um culto de adoração, o culto fúnebre seria depois. Fiquei impressionada com seu desejo de adorar a Deus, num momento de vida em que ele poderia estar murmurando.
Entretanto, o que mais me chamou a atenção foi a certeza que ele demonstrou na salvação em Cristo e no desejo de encontrá-lo face a face. Chama a atenção também a sensação de dever cumprido.
Ouvindo as palavras do pastor Xavier, creio que entendi as palavras de Paulo aos Romanos: “Se vivemos, vivemos para o Senhor; e, se morremos, morremos para o Senhor. Assim, quer vivamos, quer morramos, pertencemos ao Senhor” (Romanos 14.8).

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Ensina-nos a orar

Quando penso na vida de Jesus, me admira como Ele gastava tanto tempo em oração. Mesmo sendo Deus, Jesus orava intensamente e freqüentemente.
Jesus sempre era visto orando, tanto que os discípulos, que certamente admiravam vários de seus hábitos, o pediram “ensina-nos a orar” (Lc11.1). Eles já haviam visto Jesus pregar, se portar em público, ler a Palavra de Deus. De todas as coisas que poderiam ter pedido para que os ensinasse, preferiram aprender a orar.
Antes de ensinar-lhes a orar, Jesus mostrou em sua própria vida a importância da oração da melhor forma: orando.
Jesus atende ao pedido dos discípulos e lhes ensina que devem orar por seus inimigos e por seus perseguidores (Mt5.47), orar para que não caiam em tentação (Lc22.40) e disse-lhes que tudo o que pedissem receberiam se confiassem (Jo11.22). Jesus lhes mostrou que poderiam orar em todas as situações.
Além de dizer-lhes pelo quê orar, Jesus ensinou-lhes qual deveria ser a postura de seus discípulos ao orarem.
Jesus lhes ensinou que deveriam orar em secreto (Mt6.6), que não deveriam repetir palavras sem sentido, que não deveriam fazer das disciplinas espirituais algo para mostrarem aos outros (Lc18.10).
Quando penso nisso, imagino que Jesus queria mostrar-lhes o quão íntimos de Deus eles poderiam ser através da oração. Ao invés de repetir-Lhe palavras sem sentido, poderiam expor-Lhe seus sentimentos. Ao invés de mostrar aos outros homens suas virtudes, deveriam mostrar para Deus suas fraquezas. Mais uma vez, Jesus quebrava paradigmas e aproximava-os de um Deus que queria se relacionar com as pessoas.
Em toda a Bíblia temos outras pessoas que nos incentivam a buscar a Deus pela oração, dando ênfase à postura:
Paulo falou às igrejas sobre oração ensinando que o Espírito Santo ensinaria a orar (Rm8.26), que deveriam orar incessantemente (1Ts5.17) e perseverar na oração.
Davi nos incentiva a buscar a face do Senhor sempre (1Cr16.11) e a nos quebrantarmos diante do Senhor: “um coração quebrantado e contrito, ó Deus, não desprezarás” (Salmo 51.17).
Conheço um folheto evangelístico que diz o seguinte sobre oração “Deus conhece o seu coração e está mais interessado na atitude do seu coração do que em suas palavras”. Sabemos que o Senhor resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes(Tg 4.6), isso tem muito mais a ver com postura do que com o que pedimos.